Entre o Norte de Portugal, a Galiza e Castela e Leão existe muito mais do que uma linha de fronteira — há montanhas que se prolongam de um lado ao outro, rios que cruzam histórias e uma herança comum que resiste ao tempo. Já fomos um mesmo território. Hoje, somos três regiões com um presente vibrante e um futuro que se quer partilhado. O turismo transfronteiriço é uma dessas pontes modernas. Uma oportunidade de criar experiências únicas que combinam culturas, sabores e paisagens sem pedir qualquer tipo de passaporte.
Imagine um programa de vários dias que começa nas vinhas durienses e termina nas planícies de Salamanca, que cruza as serras do Gerês e da Sanábria, que junta o Atlântico da Galiza à ruralidade de Trás-os-Montes. Produtos como o Caminho de Santiago — um dos maiores motores espirituais e turísticos da Península — são apenas a face visível de um potencial muito mais vasto. Há termas que se complementam de um lado e do outro da fronteira – e que se têm modernizado -, castelos e fortalezas com histórias entrelaçadas, enogastronomia com raízes comuns, e parques naturais que se estendem sem barreiras administrativas.
Há trilhos pedestres ou de BTT que podem ser criados, baseando-se nos antigos caminhos de contrabando (de café, tabaco, gado, tecidos, sal…), com recriação de episódios históricos, visitas a aldeias raianas e experiências gastronómicas temáticas.
Estadias temáticas, de fim de semana, podem ser feitas para pequenos grupos em aldeias de fronteira, com envolvimento da comunidade local. E incluir workshops de ofícios tradicionais, roteiros com burros mirandeses, passeios de barco, no Douro ou no Minho, e noites de contos.
É possível estabelecer roteiros culturais centrados nas fortificações e postos fronteiriços usados tanto na guerra como no contrabando, com uma componente histórica forte (Guerras da Restauração, Guerra Civil Espanhola, Guerra Peninsular) e visitas guiadas com foco na resiliência das populações raianas.
Isto permite explorar eixos entre localidades ou regiões, dentro da região, como:
Esta diversidade pode e deve ser estruturada de forma integrada, com empresas portuguesas ou portuguesas e espanholas a desenharem, juntas, ofertas turísticas inovadoras, sustentáveis e internacionalizáveis. O visitante moderno procura autenticidade, mas também fluidez — quer sentir que está a explorar algo único, mesmo quando muda de país. Cabe às empresas do setor dar forma a essa ambição, criando pacotes que reflitam o território vivido e sentido, e não apenas o que está nos mapas.
Um Cluster que aponta caminhos
O Cluster Transfronteiriço de Turismo Galiza–Norte de Portugal, lançado em 2024, é uma das ferramentas que materializa este espírito colaborativo. Mas o verdadeiro motor desta transformação está nas mãos de quem concebe as experiências, acolhe os turistas e gera impacto económico local. A Eurorregião, com apoio institucional consolidado ao longo de décadas, oferece o palco e os meios. Agora, é o tempo de subir ao palco e criar novas narrativas.
Empresas de animação turística, agências de viagens, operadores e hoteleiros têm aqui uma oportunidade clara: trabalhar com os seus vizinhos espanhóis para dar ao mundo um destino que é, ao mesmo tempo, plural e coerente. Um destino que pode ser vendido em Nova Iorque, São Paulo ou Toronto como uma travessia cultural entre dois países, repleta de vivências autênticas, histórias ancestrais e hospitalidade de fronteira.
“A criação do primeiro Cluster de Turismo de uma Eurorregião vai permitir que os dois territórios se apresentem em conjunto nos mercados, sobretudo nos mercados de longa distância, de forma mais competitiva, promovendo a ideia de dois países e um destino”, referiu Luís Pedro Martins, presidente do Turismo do Porto e Norte de Portugal, durante a apresentação deste Cluster, em agosto do ano passado.
O responsável adiantou que “a otimização de recursos e o trabalho conjunto das quatro entidades que compõem este consórcio permitirá a estruturação e promoção de produtos turísticos de lazer e de negócios que beneficiarão o setor empresarial do turismo dos dois territórios da Eurorregião”.
Com vontade política alinhada, fundos estruturais disponíveis e um território rico em identidade, resta apenas dar o próximo passo. Porque o que nos une — enquanto regiões, enquanto povos — é mais do que um caminho: é uma paisagem de possibilidades.